Confira o relatório da reunião do Coren-RN com profissionais de enfermagem da rede da Atenção Básica em Saúde (ABS):
Este relatório é o produto de uma reunião convocada pelo COREN-RN que aconteceu no dia 11 de fevereiro no Departamento de Enfermagem da UFRN, com o objetivo de avaliar a situação atual do serviço de enfermagem da rede municipal da Atenção Básica de Saúde (ABS) em Natal.
A referida reunião contou com a presença de 41 (quarenta e um) profissionais de enfermagem em sua maioria enfermeiros que desenvolvem suas funções e atribuições na ABS, também presentes técnicos de enfermagem, estudantes e docentes da UFRN, dirigentes da ABEn-RN, SINDERN e COREN-RN.
A reunião iniciou com exposições sobre a realidade atual de funcionamento das unidades de saúde e as condições de trabalho dos profissionais de enfermagem/saúde destacando a estrutura física, a situação do quadro de pessoal, os instrumentos de trabalho e insumos. O cenário configurado a partir dos pronunciamentos revelou uma série de problemas estruturais comuns a todas as unidades e alguns problemas específicos.
A seguir estão detalhados os principais problemas mencionados:
1. Identificação de problemas estruturais e conjunturais comuns às unidades de saúde da SMS/Natal. A situação foi sistematizada em oito eixos de problemas, alguns crônicos e outros conjunturais que sugerem se tratar de uma política deliberada pela Prefeitura de Natal de promover o sucateamento da rede básica que vem tentando incorporar a lógica da promoção da saúde e prevenção das doenças na perspectiva de um modelo de atenção integral. Este conjunto de problemas revela a opção política da Prefeitura por um modelo de atenção apenas curativo, voltado para o tratamento de doenças:
• Déficit de pessoal de saúde: equipe (s) de saúde incompleta (s) com a crônica falta de médico (s) e, inclusive de outros profissionais como farmacêutico, técnico de enfermagem, ACS, enfermeiro e vigilantes;
• Desabastecimento de insumos/medicamentos/materiais de consumo nas unidades, principalmente nos seguintes itens: gazes, luvas, máscaras, água, soro fisiológico, papel-toalha, papel higiênico e detergente; bloco de receituário e de solicitação de exames; medicamentos anti-hipertensivos acrescido do problema das farmácias populares não aceitarem prescrição de enfermeiros comprometendo o programa dos hipertensos; hipoglicemiantes, até mesmo quando chega insulina faltam seringas e agulhas; camisinhas e anticoncepcionais (em algumas unidades, a falta dos métodos anticonceptivos ocorre há cinco meses), entre outros.
• Falta de manutenção e de reposição de equipamentos básicos: como por exemplo, tensiometro, entre outros.
• Falta de acesso a exames laboratoriais – rede laboratorial do município está sucateada; falta material para coleta de exames das gestantes e os exames de rotina de pré-natal não estão sendo garantidos.
• Nenhuma das unidades presentes tem internet funcionando, fato que impossibilita a marcação das referências – em alguns casos enfermeiros assumem despesas para garantir a marcação.
• Espaço Físico sem manutenção: paredes com presença de infiltração, mofo, reboco caído, rachaduras em tetos; serviço de higienização/limpeza precário; sujeira compromete a segurança de procedimentos técnicos e o necessário controle de infecção; salas de curativos e vacinas com estrutura física inadequada; falta de manutenção de caixas de gordura e fossas ao ponto de minar água contaminada no espaço da unidade; destino inadequado de lixo e presença de roedores e insetos, comprometendo a biosegurança.
• Insegurança nas unidades – déficit de vigilantes; acompanhantes de pacientes portando armas; casos de violências.
• Descaso com a ESF no município de Natal – coordenação da ESF é ausente e não há supervisores territoriais.
2. Problemas específicos por unidades de saúde:
• USF Panatis: aparecimento de ulcera de pressão (UP) na maioria dos diabéticos.
• USF Planície das Mangueiras: insegurança na unidade pela falta de vigilantes.
• USF Potengi: fita crepe sendo utilizada para fixar scalp.
• USF Nova Natal I: a unidade foi interditada e os profissionais "remanejados" para atendimento em um ônibus.
• USF Nova Natal II: há um processo de despejo; a água da pia onde se lava as mãos retorna pelo esgoto inundando a sala; higienização precária “a unidade é uma verdadeira pocilga” foi encontrada até lagartixa morta dentro da caixa d’ água que abastece a unidade, destaca que tem uma AME vizinho à unidade.
• USF Cidade Praia: ausência de EPI’s aumenta riscos de acidentes de trabalho.
• USF Santa Catarina: O teto está desabando, a sala de expurgo invadida por mofo e ratos e acúmulo de entulhos/lixo na unidade.
• USF Santarém: formigueiros invadem as paredes; foram encontradas duas cobras na unidade; a direção da Unidade pressiona os profissionais a trabalharem sem condições.
• USF Soledade I: faltam ACS e estes ainda recebem a delegação de preencher receitas médicas.
• USF Soledade II: em reforma desde agosto de 2010, os profissionais atendem em meio à tinta, poeira e barulho.
• Igapó: total insegurança para profissionais e usuários do SUS, acompanhantes de pacientes portam armas; falta carro para realizar visitas domiciliares; presença de esgoto a céu aberto.
• USF Nova Cidade – higienização precária e a água sanitária em uso encontra-se vencida com data 2006 e 2007.
• USF Guarita – não tem tensiômetro; na estrutura física além de mofo tem cupim.
• Sede do D. Leste – se encontra interditada e as unidades de saúde estão sem comunicação com a sede do Distrito.
• Centro Clínico da Ribeira: paciente precisa ir duas vezes à unidade para o mesmo procedimento.
• C. S. Ponta Negra: há apenas um técnico de enfermagem para responder por todo o trabalho de enfermagem, salas de curativo e vacinas fechadas sob protestos da população que conseguem forçar o atendimento ainda que precário.
• C.S. Pirangi – diante da falta de medicamentos os pacientes estão comprando medicamentos quando conseguem ou ficam sem o tratamento; sala de vacinas possui geladeira pequena que não atende a demanda.
• C. S. Nova Descoberta - esterilização deficiente, pois, não há separação entre expurgo e preparo, uso de papel manilha para empacotar materiais a serem esterilizados e falta balde com tampa; destaca que a unidade esteriliza materiais para todas as unidades do distrito Sul.
Os relatos revelam a ausência de um sistema municipal de abastecimento de insumos/medicamentos/materiais para as unidades a situação que já vem denunciada pelo CMS e MP; chamam a atenção para a insegurança com casos de violências que causam sofrimento psíquico aos trabalhadores; destacam a pressão exercida pelos gestores para manter atendimentos e procedimentos sem sequer garantir condições mínimas para a oferta desses serviços.
Esta situação que beira ao caos é desmotivadora para os profissionais que chegam a adoecer de síndrome do pânico, insônia, depressão, etc. diante da precariedade das condições de trabalho, desvalorização profissional, medo e incertezas.
Os docentes da UFRN presentes a reunião confirmam as denuncias apresentadas pelos profissionais da SMS/Natal e manifestam preocupação com a ocorrência de prescrição por telefone, com possibilidades de acidentes de trabalho uma vez que a NR 32 não está implantada na SMS/Natal e a coordenadora de estágio na Atenção Básica da UFRN Profa. Dra. Rosana Lucia Alves de Vilar, afirmou que essa situação caótica interfere diretamente na formação do graduando de Enfermagem.
O COREN-RN registrou que o quadro apresentado sinaliza a pretensão Prefeitura de Natal de fragilizar a ESF implantada em todo o país como eixo estruturante da ABS, e de fortalecer a permanência do modelo curativo e hospitalocêntrico. Na contramão das políticas sanitárias atuais segundo diretrizes da OMS, OPAS e MS que propõem à organização da rede de atenção a saúde, tendo como porta de entrada, a atenção primária/atenção básica.
A forma como a gestão vem agindo, contribui para esvaziar a ESF, para realizar uma operação desmonte da rede básica e para implantar a reorganização da rede a partir de Atendimento Médico Especializado (AME) e Unidade de Pronto atendimento (UPA), que pode estar sendo a “justificativa” para a terceirizar serviços e/ou gestão da rede de saúde do Município de Natal.
As organizações da enfermagem não aceitam esta lógica, entretanto reconhecem que as AME’s e UPA’s são importantíssimas quando instituídas na rede regionalizada de atenção integral à saúde, a partir de uma ABS resolutiva para todos os cidadãos natalenses.
Alzirene Nunes de Carvalho
Presidente do COREN-RN