Virgulino Ferreira, o Lampião. Cabra macho, o terror dos sete mares (quer dizer, das sete secas) do semiárido nordestino. Temido e amado na mesma estranha proporção.
A gente gosta de imaginar o cangaceiro como nosso Che Guevara particular. O cara que, cansado da fome e do descaso político, se arretou com a classe dominante e tocou o terror. Viva la revolucion sertaneja.
Reza a lenda que, se bem recebido numa cidade, promovia um baile onde distribua dinheiro para os pobres. O Robin Hood da caatinga.
Mas, se a cidade negasse apoio ao seu bando, era bala e confusão. Não sobrava ninguém.
Romantismo histórico (e bairrista) à parte, Lampião andou na tênue linha que separa o herói do ladrão. O mocinho, do cocô do cavalo do bandido.
Ame-o ou leve bala.
Numa empreitada foi ferido no olho. Ficou cego e disse:
- Tem nada não, eu só preciso de um olho pra atirar. Mesmo tendo dois, eu tenho que fechar um pra mirar.
A partir daí, Che Lampião passou a usar o objeto que virou sua marca registrada: óculos redondos, tal qual, anos depois, o beatle John Lennon.
Pois bem, esses óculos, usados pelo Rei do Cangaço que, só por capricho estético eram de ouro 16 quilates, acabam de ser roubados do museu de Serra Talhada, cidade natal de Virgulino Ferreira, nosso herói/ídolo/ladrão/cocô do cavalo do bandido.
Segundo nota oficial, o presidente do museu disse que a peça sumiu após uma visitação e foi facilitada pelo fato de que o local não conta com sistema de vigilância com câmeras ou guarda municipal.
Mais uma vez, passaram a perna no Estado. Ou foi o Estado que passou a perna no povo? Nunca sei bem a resposta desse dilema.
O povo rouba por falta de condições de vida ou a falta de condições de vida faz o povo roubar?
La Revolucion continua, pelo que tudo indica.
Sei não, mas acho que esses óculos já foram derretidos (flashback taça da copa do mundo) e viraram anel na mão de madame que, por sua vez, pagou pelo serviço e o dinheiro virou comida na mesa de outro alguém.
Esse é o Circle of Life que o Rei Leão se refere no filme da Disney. Cada um tem o rei que merece.
Mas todos obedecem à lei da selva e da sobrevivência.
E ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão?
Fico imaginando o pessoal do museu com as mãos na cabeça e Lampião rindo lá no céu.
Se é que ele foi pro céu.
Se é que existe céu.
Téta Barbosa é jornalista, publicitária, mora no Recife e vive antenada com tudo o que se passa ali e fora dali.
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